Fringe finalmente revela suas pepitas
Miguel Anunciação*
Crítico/Espetáculos
CURITIBA (PR) - Nenhuma outra edição do Fringe atraiu tanta gente: tanto bateu recorde de inscrições (passou de 500) quanto de número de montagens. Na largada dessa edição, 264 títulos angariavam atenções na mostra paralela. Obviamente, desistências já ocorriam antes mesmo de o festival começar: “Amoroscuro”, de Ouro Preto, por exemplo, não pôde vir por escassez de tempo para fechar os ensaios.
Há tempos o Fringe tem sido fonte de belos achados. Foi assim com o Espanca!, a Cia Clara, a Luna Lunera, todos de Minas. Mas as edições anteriores nunca haviam demorado tanto a apresentar pepitas. Uma é de Minas - “Fala Comigo Como a Chuva” ganhou comentários elogiosos, espaços generosos.
Um dos melhores trabalhos da temporada mineira de 2008, a montagem da Cia Teatro Adulto pode render a Samira Ávila os dois prêmios de Melhor Atriz. Ela, que já atuou no Espanca!, dificilmente encontrará concorrência à altura. A luz de Telma Fernandes também deve concorrer aos prêmios. É ótima.
O texto curto de Tennessee Williams não reserva muito espaço para Luiz Arthur, sujeito que volta para o lar após uma temporada de desregrada bebedeira. Excelente ator, Luiz parece aquém da tarefa de insinuar as intenções do seu personagem com tão poucas palavras. A direção de Cynthia Paulino, a primeira num patamar profissional, demonstra traquejo. Ergue um espetáculo digno, convincente. Talvez redundante na escolha das canções da trilha, um tanto legendas, e seja menos feliz em certas escolhas (a água que escorre ao fundo, um painel com um recorte de Klimt, figurinos seguidamente tirados, molhados, recolocados; e vasos de vidro no canto esquerdo do palco), que não colaboram para sugerir mais camadas de interpretação do texto e das situações. Ainda assim, o espetáculo se impõe. É altamente recomendável, e um nível tão consistente que o destacou entre centenas de alternativas em Curitiba.
Outro destaque do Fringe até aqui é “Além da Mágica”, show de ilusionismo do paulista Célio Amino, ainda que soe realmente estranho que um show de mágica chame tanta atenção num festival consagrado ao teatro. Além de o teatro não estar grande coisa neste Fringe, o espetáculo de Amino é encantador, um grande programa para espectadores de todas as idades. Além de os números impressionarem, o espetáculo propõe uma dramaturgia básica, de como um garoto atento, curioso, aprendeu esta técnica milenar com um mestre japonês. Ele mesmo um descendente de japoneses, Amino é um mágico diferenciado: não incorre no arrogância da performance, na ilusão de que domina completamente seu ofício. Tanto cede a impressão de poder falhar, como não se desespera com esta possibilidade. Todo o espetáculo é perpassado por falas de cunho filosófico, inclusive que cada um dos mágicos, isoladamente, perpetuariam uma tradição. Amino perpetua, com imensa graça.
Esta bela criação supervisionada por Chiquinho Medeiros, poderá ser vista em outros praças, muito em breve: os curadores dos festivais de Salvador, Nehle Franke, e Ipatinga, Michel Ferrabiamo, pegaram contato. Amino, no entanto, tem agenda cheia em 2010: foi escolhido para participar de uma versão operística de “A Flauta Mágica”, em Paris, dirigida por nada menos que Peter Brook. Sentiu o nível?.
(*) O jornalista viajou a convite do festival.
sábado, 28 de março de 2009
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