sábado, 30 de agosto de 2008

ORA, AS LEMBRANÇAS DE AMOR NÃO ABREM EXCEÇÃO ÀS LEIS GERAIS DA MEMÓRIA, REGIDAS TAMBÉM ESTAS PELAS LEIS MAIS GERAIS DO HÁBITO. COMO O HÁBITO ENFRAQUECE TUDO, O QUE MELHOR NOS RECORDA UMA CRIATURA É JUSTAMENTE O QUE HAVÍAMOS ESQUECIDO (PORQUE ERA INSIGNIFICANTE E ASSIM LHE HAVÍAMOS DEIXADO TODA A SUA FORÇA). EIS POR QUE A MAIOR PARTE DA NOSSA MEMÓRIA ESTÁ FORA DE NÓS, NUMA VIRAÇÃO DE CHUVA, NUM CHEIRO DE QUARTO FECHADO OU NO CHEIRO DE UMA PRIMEIRA LABAREDA, EM TODA PARTE ONDE ENCONTRAMOS DE NÓS MESMOS O QUE A NOSSA INTELIGÊNCIA DESDENHARA, POR NÃO LHE ACHAR UTILIDADE, A ÚLTIMA RESERVA DO PASSADO, A MELHOR, AQUELA QUE, QUANDO TODAS AS NOSSAS LÁGRIMAS PARECEM ESTANCADAS, AINDA SABE FAZER-NOS CHORAR. FORA DE NÓS? EM NÓS, PARA MELHOR DIZER, MAS OCULTA A NOSSOS PRÓPRIOS OLHARES, NUM ESQUECIMENTO MAIS OU MENOS PROLONGADO. GRAÇAS TÃO-SOMENTE A ESSE OLVIDO É QUE PODEMOS DE TEMPOS EM TEMPOS REENCONTRAR O SER QUE FOMOS, COLOCARMO-NOS PERANTE AS COISAS COMO O ESTAVA AQUELE SER, SOFRER DE NOVO PORQUE NÃO SOMOS MAIS NÓS, MAS ELE, E PORQUE ELE AMAVA O QUE NOS É AGORA INDIFERENTE.
NA PLENA LUZ DA MEMÓRIA HABITUAL, AS IMAGENS DO PASSADO POUCO A POUCO EMPALIDECEM, APAGAM-SE, NADA MAIS RESTA DELAS, NÃO MAIS A TORNAREMOS A ENCONTRAR. OU ANTES, NUNCA VOLTARÍAMOS A ENCONTRÁ-LAS SE ALGUMAS PALAVRAS NÃO TIVESSEM SIDO CUIDADOSAMENTE ENCERRADAS NO ESQUECIMENTO, DA MESMA FORMA QUE SE DEPOSITARA NA BIBLIOTECA NACIONAL O EXEMPLAR DE UM LIVRO QUE, SEM ISSO, CORRERIA O RISCO DE TORNAR-SE INENCONTRÁVEL.
Marcel Proust
em busca do tempo perdido
Volume 2
à sombra das raparigas em flor

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